domingo, 2 de dezembro de 2007

Soneto Oco


Se pedires mulher, lhe faço um soneto.

Com versos e rimas, de forma nobre.

Se chorares, teremos aqui um dueto.

Uma triste senhora e um poeta pobre

Os versos que escrevo, eu sei, maldito,

Seja aquele que por fim os desenvolve

Vergonha a poesia, sou poeta dito.

Sem palavras, tolo, quando mal desejo morte.

Mas se escrevo assim é porque tanto

Na ponta de meus dedos desliza o grafite

Que contorna os versos que lhe dedico

Pois quando penso em ti, portanto

É melhor evitar que o poema grite

E esconder-me por trás do que fabrico.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Complementares


Ver-te, apenas, me inspira e movimenta entranhas...

E quando me toco, imagino coisas estranhas.

Nas camas dos bairros mais pacatos

Acontecem as perversões do moralismo

Eu prefiro me benzer de ceticismo...

Quando vejo-te, nua, cometendo atos

Analiso tuas mãos lisas, impuras

E nas tuas impurezas alcanço meus cuidados

Eu prefiro me perder entre seus delicados

Seios fartos, e olhares que conjuras.

Se é amor ainda não explico

Mas sei que quando deitas eu me complico

E entre os lençóis exatos

Me resta debruçar sobre seus contatos

E gozar diante de seus gritos

Quando toco em tuas partes íntimas

Percebo míseras expressões ínfimas

De quem gosta do sentido tato

E sei que quando pede coisas mínimas

Vens com aquelas falas tímidas

Sabendo que o prazer é um fato.

E diante do teu suor transpirante

Me deslizo no teu corpo feito amante

E encontro na tua boca já cansada

Uma gota de saliva descuidada

Que na minha boca torna-se habitante

E em tua delicadeza efervescente

Eu me acolho calmo e lentamente

Para assistir seu espetáculo mais gentil

Quando sobre este corpo descontente

Lança mil prazeres, e envolvente...

Faz sentir o que este corpo jamais sentiu.

sábado, 30 de junho de 2007

Delirium


Ouço-te em tua ausência,

E dizes o que mais quero ouvir

Nisso pergunto a mim mesmo

Se o que dizes sou eu a me mentir

E tu falas de encanto e alegria,

De cores e primaveras a porvir

E eu me perguntando em poesia

Se o que dizes sou eu a me mentir

Olho aos redores de meu espaço

Nas calçadas, avenidas o ir e vir

Mas o que vejo sou eu num descompasso

Me dizendo o que eu necessito ouvir

E julgo meus pensamentos enganadores

E me irrito com este estado febril

Mas quando fecho os olhos, novamente

Ouço-te, eu me dizendo, o que tu jamais sentiu

E vejo-me dividido nestas vozes

Em palavras que me atravessam o pensamento

E o que me resta é rogar que tais acordes

Se calem sequer por um momento.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Cantiga


Marinheiro quando chora
chega a aumentar o mar
Marinheiro quando chora
chega a aumentar o mar

Quando o sol nascer
marinheiro vai ficar
sem tempo para dizer
quanto tempo pode amar

Se o barco for partir
marinheiro vai chorar
pois com ele tem que ir
e a mocinha abandonar

Marinheiro quando chora
chega a aumentar o mar
toda vez que vai embora
outro alguém tem que ficar.



Escrito por Filipe M. Vasconcelos

quinta-feira, 5 de abril de 2007

Manicômio e o Duplo da Doença Mental


Quando aponto meu relógio sem ponteiros

O homem equilibrado ironiza-me para terceiros

Ele acredita ser indícios de loucura

Mas pouco sabe que diante desta arquiterura

Pouco vale, ter nos punhos, norteios.


Ando com passos, por sinal, desajeitados

Feito pombos, em gaiolas, depositados

A platéia que diariamente me assiste

Iguala meu andar à esquisitice

De animais com seus lobos estirpados


Livre das grades por pinel

Não mais sustento correntes neste quartel

Mas enquanto me libertam, neste ato idolátrico

Me aprisionam no saber psiquiátrico

E fundam a incontestável Doença Mental


As algemas, que de meus membros retiraram

Reverteram-se em remédios que me doparam

Não sou o mesmo que entrara por estes portões

E confesso que dentro de cada um desses corações

Resta um pouco de saudade dos que um dia amaram.



Já ouvi vozes de pessoas gritando

Já assisti imagens de bailarinas sapateando

Mas em nenhum momento minha loucura

Chegou ao nível dessa estúpida postura

Que nosso cientista permanece adotando.


segunda-feira, 12 de março de 2007

Vieses

Podemos fantasiar a vida

Dar a ela um valor poético

Mas quando perde sangue

Todo poeta vira cético...

Podemos fantasiar a vida

Dar a ela um valor religioso

Mas quando perde sangue

Todo padre procura encosto...

Podemos fantasiar a vida

Dar a ela um belo salvador

Mas quando se perde sangue

É você quem sente dor...

Podemos fantasiar a vida

Dar a ela valor de contentamento

Mas quando se perde sangue

Quem ri por um momento..?

Eu posso fantasiar a vida...

Dar a ela uma bela melodia

Mas se eu perder meu sangue

Você veria minha agonia..?


Escrito por Filipe M. Vasconcelos

sexta-feira, 2 de março de 2007

Velhice


No espelho, com minhas palmas erguidas

Percebo minhas mãos envelhecidas

Meu corpo se modificara

Aquele que a natureza edificara

É consumido por horas seguidas

Meus pêlos, cuja imagem declina

Perderam suas doses de melanina

E agora se branqueiam feito neve

Sinalizando que a morte está breve

E que minha juventude se elimina

Mues braços, outrora tão viris

Agora só sustentam os remédios dos febris

A medicina não me cura

Enquanto o tempo me procura

Para lançar outra cicatriz

Essa matéria que então se modifica

Com outros animais se identifica

A evolução me tornou forte

Mas depois da reprodução segue-se à morte

Que o biólogo tanto decodifica

E para festejar minha doente condição

Bebo num copo, igualmente em decomposição

Um veneno líquido e amargo

Para abrevir essa vida com o encargo

De quem sabe se eximir da solidão


Escrito por Filipe M. Vasconcelos